segunda-feira, 31 de maio de 2010




Ela guardava todas aquelas palavras no silencio do seu coração, mas continuava a contemplar o nascer e o crepuscular do sol de sob a árvore. Observava na calmaria dos dias que se seguiam como o vento ia desenhando no chão o destino daquelas folhas secas, que em ruídos sinuosos, começavam a se tornar um (húmus) com a terra. Mas a flor ainda não brotara, porque depende de outras vidas pra existir... Processo irrenunciável de sua condição: a dependência.

E as folhas seguiam o seu destino, gradual e ininterrupto, de presentear a terra com a fertilidade que ela carece pra existir na flor. Enquanto isso, o broto, nascituro da flor, aguarda pacientemente o período em que o ventre da terra o acalenta e adormece, desenvolvendo a força da haste que sustentará seu pequenino corpo.

E lá, sob a árvore, estava a menina cantarolando suas imperfeições e imaginando o momento em que seus pés pisariam novamente na relva molhada pelo chorar da noite. “É, pensava ela, a lua chora e esses pingos brilhantes são suas lágrimas por não poder encontrar o seu querido amigo sol, porque quando ele chega, ela parte; quando ela parte, ele vai em direção contrária”.

E isso era pra menina das pernas curtas e das mãos grandes, um grande engodo: o sol que fascina a lua, sabendo de sua condição de estrela maior incandescente, e que não poderia tê-la, engravida a terra com o melhor de seus presentes e oferece a lua em demonstração de seu amor: uma pequena flor amarela.

Mas que espanto, a flor quando nasce se volta sempre em direção ao sol e a pobre lua continua, no silencio e gélida noite que segue, sem sequer poder contemplar a face de seu pequeno sol, pois ele, tão desejoso pelo que o criou, não percebe que uma triste lua, busca lhe acariciar em brisa leve a face.

Daí a menina fica a esperar que a lua surja todas as noites para compartilhar de sua solidão.
Ela diz que ficar em silencio a contemplar sua bola de gelo alivia o coração, porque na simplicidade do seu olhar, segreda a lua os manuscritos confessos de uma dor que, segundo ela, é frutuosa, porque a coloca na condição de existir. E junto com a humanidade, a menina segue a sina de aceitar o momento presente, de renunciar para ganhar e recuar para prosseguir.
Ela sabe que é preciso descer da árvore, que não pode ficar mais do que o tempo necessário. Sente que já excedeu sua cota de paciência, mas desaprendeu a andar, tanto que se recolheu nos galhos de sua paixão silenciosa. É estranho, mas desenvolveu com a árvore uma afeição que poucos humanos conseguem ter. Sente-se planta na maior parte das vezes. É isso que confere o prazer momentâneo de ficar e não descer; de se alimentar da luz e de sugar a água que a chuva lhe presenteia. O que os transeuntes vêem como galhos secos e retorcidos pelo calor, ela vê como um regaço acolhedor que a resguardou dos maiores perigos.

Ela vai descer. Não antes de gravar com as próprias unhas na casca grossa da arvore suas confissões de amor. Ela vai fazer desse invólucro rude o pergaminho que conterá os manuscritos de seu existir.

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